Copycat behavior nas demissões em massa
Jeffrey Pfeffer, professor da Stanford Graduate School of Business, explica o fenômeno
É difícil não sentir desconforto ao ver tantas publicações de pessoas impactadas pelas demissões em massa. Parece que houve um revés no clima de fim de ano e o sentimento de desesperança tomou conta daqueles que um dia tiveram muito orgulho em fazer parte do ecossistema de inovação do Brasil.
Eu sou uma dessas pessoas. E desde que fui impactada em uma dessas ondas, estou desenhando meus próximos passos com bastante cautela. No entanto, tenho consciência de que essa cautela a que me refiro tem a ver com meus privilégios porque a realidade não é assim. Por saber o impacto na qualidade de vida e na saúde de milhares de demitidos, é impossível não questionar todo esse movimento de demissão, que foi o grande tema do mercado este ano, em minha opinião.
Recentemente, li uma entrevista de Jeffrey Pfeffer, professor da Stanford Graduate School of Business, acerca de uma pesquisa feita por ele que mostra o impacto devastador das demissões em massa na saúde das pessoas. Além disso, o professor foi taxativo a respeito da razão dessas demissões e quero focar especificamente nesse último ponto.
De acordo com Pfeffer, as reduções da força de trabalho que estão acontecendo na indústria de tecnologia são resultado principalmente de “contágio social”. Ele explica que quando algumas empresas demitem funcionários, outras provavelmente farão o mesmo.
O copycat behavior (algo como comportamento imitador) faz com que todo esse movimento de demissão seja pouco embasado na ciência e em evidências. Além disso, Pfeffer comenta que demissões em massa não servem para melhorar o desempenho da empresa porque, além do alto custo do pacote de indenizações, a onda de cortes causa insegurança em quem fica, reduzindo a produtividade e, consequentemente, os resultados.
"Às vezes, as empresas demitem pessoas que acabaram de recrutar. Quando a economia voltar nos próximos 12, 14 ou 18 meses, eles voltarão ao mercado e competirão com as mesmas empresas para contratar talentos. Eles estão basicamente comprando mão de obra por um preço alto e vendendo por um preço baixo. Não é a melhor decisão.", explica Pfeffer.
A melhor solução, para ele, seria um corte salarial. Ele dá o exemplo da Lincoln Electric que em vez de demitir 10% de sua força de trabalho, fez com que todos recebessem um corte salarial de 10%, exceto a alta administração, que teve um corte maior. Então ao invés de dar 100% da dor para 10% das pessoas, eles dão 100% da dor para 100% das pessoas.
O que mais me chamou atenção nisso é que realmente parece existir o copycat behavior no mercado, com decisões que são supostamente estratégicas, mas que, na realidade, não são embasadas em evidências e causam profundo impacto nos resultados da empresa, na visibilidade da marca empregadora e, mais importante, na vida de pessoas.
Tudo isso, para mim, acende um sinal amarelo para toda essa era de especialistas de mercado que tanto vemos aqui no LinkedIn. Será que todos os movimentos que vemos o mercado fazer e todas as estratégias que aparecem por aqui são, de fato, baseadas em ciência e em evidências ou são simplesmente fruto de contágio social/copycat behavior?
Acredito que já passou da hora do LinkedIn deixar de ser um lugar onde líderes e especialistas buscam construir autoridade e audiência exaustivamente para ser um lugar com mais diálogos e questionamentos para que o mercado de trabalho (seja tech ou não) se torne mais saudável, mitigando vieses e silos.
Há esperanças? Sempre há!
Por aqui, sigo na torcida para que algumas tendências também caiam na trilha do copycat behavior, mas dessa vez impactando positivamente o mercado e a vida das pessoas. Destaco as principais tendências que considero positivas e que saíram recentemente aqui no LinkedIn Notícias.
(texto abaixo retirado da reportagem de Scott Olster, Thiago Lavado e Tonia Machado):
As expectativas em relação ao significado do trabalho serão ajustadas
Nos últimos anos, o propósito ganhou um peso cada vez maior para profissionais ao redor do mundo – e o Brasil não ficou de fora. A pesquisa “Edelman Trust Barometer 2021” revelou que “74% dos brasileiros esperam poder gerar impacto social e afirmam que fatores como o negócio refletir seus valores pessoais são decisivos para avaliar ou considerar um emprego”. O movimento conhecido como “Great Reshuffle” refletiu isso, com milhares de profissionais abrindo mão de empregos estáveis em busca de um trabalho que preenchesse seu senso de propósito.
A multiplicação de startups estampando missões grandiosas e o apoio crescente de empresas a causas nobres fizeram com que os profissionais percebessem que é possível querer um trabalho que não apenas pague suas contas, mas que também contribua para um mundo melhor.
No entanto, em um cenário de incertezas e demissões em massa – que vem incluindo até mesmo os altamente demandados profissionais de tecnologia –, é provável que as expectativas em relação ao trabalho precisem passar por um ajuste (ainda que temporário) para que se tornem mais realistas. Pessoas que pediram demissão na “Grande Renúncia” e que ainda não se recolocaram já estão começando a se arrepender, com receio de que o mercado piore. Um trabalho pode envolver um propósito maior de melhorar o mundo, mas muita gente está começando a se perguntar se simplesmente pagar as contas e permitir uma rotina equilibrada já não seria bom o bastante – pelo menos temporariamente.
“O propósito pode estar nas pequenas coisas, na diferença que você faz na vida de uma pessoa, na contribuição que você oferece para um colega e até mesmo na melhoria da qualidade de vida que proporciona para a sua família”, afirma a especialista em recolocação Mariana Torres. — Ana Prado
A era do CEO herói chegará ao fim
Em algum momento entre o ano 2000 e o início dos anos 2010, os fundadores de empresas do Vale do Silício começaram a adquirir um status de semideuses. CEOs de companhias de tecnologia, como Mark Zuckerberg, do Facebook, Elon Musk, da Tesla, Travis Kalanick, da Uber, e Adam Neumann, da WeWork, se tornaram conhecidos com o apoio dos investidores — e as pessoas prontamente os seguiram.
Jovens diplomados que entraram no mercado de trabalho após a recessão de 2008 encontraram pelo caminho promessas vindas de quem havia desistido da faculdade, como Zuckerberg. Esses jovens bilionários se tornaram heróis, idolatrados em filmes, na TV e em estudos de caso de escolas de negócios.
À medida que a confiança no governo e na mídia definhava, a influência do CEO de tecnologia só crescia. Eles estavam conectando o mundo à internet, promovendo valores liberais, apoiando o casamento entre pessoas do mesmo sexo e defendendo a democracia. Enquanto isso, suas empresas cresciam — tanto em valor acionário quanto em número de funcionários.
Agora, com a economia em turbulência, a ilusão de que as empresas de tecnologia (e seus fundadores) vão nos salvar se desvaneceu. Zuckerberg pode manter suas convicções sobre o metaverso, mas demitiu 11.000 funcionários da Meta recentemente, na primeira grande demissão da empresa. Elon Musk jura que sabe como consertar o Twitter, mas cortou metade da equipe na semana em que se tornou CEO e outros milhares se demitiram posteriormente. Seus movimentos erráticos de negócios colocaram um ponto de interrogação na própria existência do Twitter.
Os chefões do Vale do Silício parecem distantes. Atualmente, o Barômetro de Confiança da Edelman revela que as pessoas ainda admiram os líderes empresariais, mas estão bastante desapontadas com sua liderança.
Sem estrelas "tech" para idolatrar, muitos de nós podemos aceitar que os problemas do futuro podem ser resolvidos por pessoas comuns. Talvez esteja na hora de nos tornarmos nossos próprios heróis. — Jessi Hempel e Tanya Dua
A liderança vai se mostrar mais vulnerável
As empresas já entenderam que ambientes saudáveis, positivos e inclusivos contribuem para a produtividade dos funcionários, e ficou claro que as lideranças ocupam papel central na construção da cultura corporativa. Por isso, é seguro dizer que a era dos gestores autoritários e distantes ficou para trás.
Mas não basta não ser autoritário. Pesquisas têm mostrado que os funcionários esperam líderes humanos e humildes, e isso inclui estar aberto a expor suas próprias limitações. Um estudo global de 2021 feito com mais de 12 mil profissionais pela organização sem fins lucrativos Catalyst revelou que, quanto mais os gestores demonstram vulnerabilidade, mais as pessoas estão dispostas a se dedicar ao trabalho.
“Os times mais fortes de que eu tive a oportunidade de participar ou construir foram aqueles em que tínhamos abertura para compartilhar nossas vulnerabilidades. Isso aproxima as pessoas e humaniza as relações, promovendo mais confiança e transparência”, diz Roberto Funari, CEO da Alpargatas, em post no LinkedIn. A tendência é que cada vez mais líderes percebam o valor da vulnerabilidade e o seu poder para nutrir laços mais duradouros e saudáveis com suas equipes. — Ana Prado