Os layoffs das empresas de tecnologia sob o olhar da economia comportamental
Desde o início deste ano (2022), as empresas de tecnologia têm aplicado layoffs (demissão em massa) para garantir a sustentabilidade do negócio. O cenário está claro: a crise econômica, a alta dos juros e a inflação mundial são um alerta para todo ecossistema de inovação (do qual sempre me orgulhei em fazer parte) puxar o freio e rever as estratégias do negócio.
O contexto macroeconômico fez com que os investidores fossem mais criteriosos e conservadores com scale-ups (empresa que tem um produto pronto com capacidade de fazer as vendas crescerem num ritmo acelerado) e passaram a focar mais em start-ups em estágio inicial, mesmo as que ainda são bootstrapping.
Particularmente, sempre olhei com muita cautela a cultura do “crescimento a qualquer custo” porque inflar o quadro de vagas, além de queimar dinheiro, impacta profundamente a vida das pessoas. E, para mim, elas são o maior ativo de qualquer empresa.
Logo, se há necessidade de ajustar as velas no negócio, cortar pessoas é a decisão mais rápida para fazer o dinheiro em caixa durar mais tempo, mas não é necessariamente a decisão que vai garantir o melhor retorno.
O que eu tenho observado ao acompanhar (e ter sido impactada por) layoffs, é que tanto a onda de crescimento e admissão quanto a onda de demissão não partem de um plano realmente estruturado de áreas, pautado em performance e em objetivos macros.
Nessa onda de layoff há outra coisa em comum em toda empresa que teve que fazer cortes de pessoas: a falta de clareza sobre os critérios de seleção sobre quem (ou que área) fica e quem sai (ou que área é despriorizada). É nesse buraco que a economia comportamental pode ser uma resposta para que, ainda que necessária, a onda de demissão seja mais justa com o principal ativo (pessoas) para que haja, de fato, o melhor retorno (o resultado do trabalho dessas pessoas). E, claro, dessa forma, garantir um crescimento sustentável do business.
Costumo dizer que não existe empresa racional porque empresas são feitas de pessoas e para economistas comportamentais, como eu (já tomando a liberdade de me considerar uma), a racionalidade, muitas vezes, é uma falácia. Nos negócios, decisões estratégicas precisam ser tomadas a todo tempo, sobretudo em momentos de crise. Vale refletir, então, sob qual aspecto ou análise tais decisões foram tomadas.
Por essa razão, listei os principais vieses comportamentais na cultura corporativa. É importante entendê-los porque eles não são conscientes, mas podem levar a escolhas que não vão maximizar resultados.
Viés de afinidade
A afinidade é a premissa para que se criem laços. Esse padrão faz com que tenhamos uma tendência a avaliar melhor as pessoas que mais se parecem conosco. É um viés muitas vezes utilizado para promoções, por exemplo, deixando de lado a avaliação por informações lógicas (como background, perfil, metas batidas) para embasar a decisão.
Viés do estereótipo
Fazer análise com base em generalizações pautadas em grupos pertencentes. Um homem pode não ser contratado para um cargo que exige mais sensibilidade porque é uma características que costumam relacionar a mulheres, por exemplo.
Viés de autoridade
O viés de autoridade exige um equilíbrio na utilização: não há nada de errado em valorizar quem entende de determinado assunto, no entanto, é um problema quando ideias que não foram postas à prova são previamente aceitas por virem de figuras de autoridade. Nesse sentido, o viés de autoridade pode esbarrar no efeito halo.
Efeito halo/viés da auréola
Podemos associar o efeito halo a uma espécie de bug mental. Esse erro acontece quando o cérebro analisa, julga e tira conclusões do indivíduo a partir de uma característica. É como se a parte representasse o todo.
Dessa forma, pessoas impactadas por figuras de maior influência e autoridade tendem a considerar e seguir indubitavelmente suas respectivas visões e opiniões, mesmo que essas hipóteses não tenham sido testadas.
Assim como a maior parte dos vieses cognitivos, é nessa resposta automática do cérebro que a influência de autoridade vira um problema e pode levar a escolhas equivocadas.
Todos os vieses citados podem influenciar diretamente todos os aspectos da vida: de saúde a relacionamento, e, obviamente, nas finanças e nos negócios.
Eles impactam profundamente resultados individuais, empresariais e governamentais, trazendo frustração e pouca eficiência. Ou seja, sem maximização da utilidade como prevê a teoria econômica clássica, induzindo, dessa forma, comportamentos e escolhas “irracionais”.
Estruturando uma nova decisão
Daniel Kahneman, ganhador do Nobel de Economia, propõe que nossa mente tem dois modelos diferentes de raciocínio e chamou esses modelos de Sistema 1 e Sistema 2: o Sistema 1 é automático, rápido e inconsciente; o Sistema 2 é acionado diante de situações que exigem mais cuidado e atenção.
Em um cargo estratégico, no qual tomar decisões podem impactar profundamente o negócio, reparos cognitivos se tornam uma possibilidade para ativar processos de tipo 2, acionando o pensamento crítico e reduzindo os vieses cognitivos (como alguns que citei acima).
Neste sentido, mostra-se prudente e estratégico buscar, além das análises macroeconômicas, consultorias de avaliação do quadro de funcionários, escopo, performance, perfil dos colaboradores para calibrar parâmetros e fazer movimentações internas visando cortes realmente assertivos.
E, obviamente, trabalhar a tríade:
• Inteligência social – capacidade de entender as preferências e emoções dos outros membros de tomada de decisão;
• Equilíbrio de influência entre os membros do grupo;
• Participação de mulheres nos grupos decisórios para garantir mais diversidade de visões.
Com esse texto, espero contribuir de alguma forma, ainda que tímida, para que os layoffs necessários (devido a erros de projeção e para mitigar efeitos do cenário econômico) sejam mais claros, objetivos, e, óbvio, justos.